quarta-feira, 11 de novembro de 2015

MICROCONTOS 159, 160, 161, 162, 163, 164

159 PAZ E AMOR, SACOU?
Num mar de situações errôneas e tensas, há sempre momentos em que uma luz renova nosso olhar e nossas emoções. Somos catapultados pelo simples, singelo, renovador, e precisamos continuar vivendo. Parece que anjos dizem ‘chega’! A descida aos infernos se estanca e ganhamos força extra para começar a subida aos céus. Realmente não estamos sós e, por isso, precisamos atender aos sinais / às mensagens que nos arrepiam o corpo e fazem pulsar o coração, vez por outra. Sem tempo para pensar, Cris aceitou uma pequena distração e amou. Depois de uma vida de experiências toscas, ela se fechou e perdeu o prumo da felicidade plena. Descrente, partiu para a vida sem amor, mas com muita força. Vida de filho; de amigos; de trabalho; de risadas; de vinho; de escritas; de leituras; de compromissos; de movimento; de outras liberdades e plenitudes. Ela guardou o coração e sua alma porque, dizia, ‘precisava pensar e repensar’. Mas ela se distraiu e amou. Eros a encontrou e achou que já era tempo de despertá-la. Nada de amor-paixão; isso ela já tinha vivido com cegueira e dor. Agora era amor-carinho, amor-sorriso, amor-delicadeza, amor-aprendizado, amor-poesia, amor-de-dois, amor-paz. Ela seria combinada e como diria Malévola ‘despertaria depois de um beijo de amor verdadeiro’. Eros e Psique aproveitariam a vida sem maldições e poucas malícias. Eros e Psique estavam em sua primeira experiência de se ver, mesmo já na maturidade. Sentir foi melhor do que ver. Ouvir foi melhor do que tocar. Só que ela resistiu, se escondeu, se perdeu, recusou, mas amou. Ela amou na distração, por encantamento e com magia. Eles não sabem o que as Moiras lhe reservam. Essas três irmãs, donas do fio da vida, movem a roda da fortuna sem livre arbítrio e, por isso, sabem que haverá dias bons e outros bem maus; sabem que o fio da vida passa por baixo da roda e por isso nunca navegarão por um ‘mar de rosas’. Ela estava nas mãos da sorte e da razão, mas amava. Ele estava nas mãos da surpresa e da distancia, e amou. Eles tinham que se experimentar, era mais forte que tudo. O que importava era que amavam e isso preenchia seus dias de cores e sons esquecidos no tempo. Ao abrir seu armário, de manha, um mundo antigo fugiu, deixando no ar um cheiro forte de um mar brilhoso e cheio de ondas espumantes. Ela percebeu que carregava em si as vestes de amor e por ele singraria mares imprevisíveis e inesquecíveis. Não tinha opção: viver é preciso e disso ela tinha certeza porque seguia um lema: ‘o tempo não para’. Na cama, outro sono profundo de paz e confiança fez abrir o seu melhor sorriso. Paz e amor, sacou? Claudia Nunes

160 E outro homem...
Sempre que Lina voltava à sua cidade, ficava angustiada. Será que a reconheceriam? Seria bem-vinda? Ela tivera uma oportunidade, era jovem, mas sumira na poeira dos seus sonhos mais impossíveis. Ela tivera muito medo, mas medo sempre fora seu sobrenome, para seus colegas. Outro mundo, outra cidade, outro homem. Sim, outro homem! Após muitas tentativas, outro homem e mais promessas. E mesmo assim, ela não teve dúvidas, apostou e sumiu dentro da vida dele. O melhor esconderijo é viver a vida do outro enquanto as promessas não se apresentam. O amor é assim: ele nos faz perder o chão porque encontramos luz em tudo mais. Ela não queria a baboseira da autonomia; ela queria o amor e do arco-íris. Afinal, até isso tinha um fim; e, no fim, o recomeço dela. Ela tinha planos e outro homem. Tanto sofrimento e tantos homens; menos sofrimento e outro homem: essa matemática era só dela e dos seus sonhos. Naquele carro, vendo seu passado se perder, ela sabia: seu tempo seria partilhado com emoções inesquecíveis e outro homem. Como dizia sua mãe: ‘ela iria aprender a ser gente!’. Outro homem e uma ponte para outra dimensão. Outro homem e outras visões, outras estradas, outras dores, outros olhares: e ela crescendo, aprendendo, se acostumando e longe daquelas montanhas com as quais acordava toda a vida. Ninguém cresce sem arriscar-se em outro qualquer coisa. Cansaço, desejo e curiosidade eram suas melhores barganhas com a vida. A desculpa dela era o amor: ela amava e tinha outro homem reeditando seus prazeres e pensamentos. Ser o que se é, é bom; mas se surpreender sendo outra coisa, é melhor ainda. Seu corpo tremia, sua alma pulava dentro e fora do movimento ‘de ser gente’ de alguma maneira e com outro homem. No trampolim da sua rotina de vida, ela saltara sem cinto de segurança e voara para longe dos outros homens sem cor, fé ou promessa. Ninguém saberia o quanto ela evoluíra para ser a melhor corista, solteira, de um cabaré de luxo, no Rio de Janeiro. Claudia Nunes

161 DECISÕES
O que é tomar uma decisão? O que sentimos ao tomarmos uma decisão? Ao tomar uma decisão cortamos vínculos com um tempo e nos jogamos noutro tempo sem ter muito onde segurar. A realidade ganha outros destinos e os destinos exigem outras decisões: esse é o movimento da vida. Alicia estava naquele telhado pronta para a decisão mais difícil da sua vida. Decidida, ela subira as escadas atônita; não tinha mais motivos para sofrer e negar: a decisão estava tomada. Mas ao abrir a porta, vira a cidade e sua vida inteira. Que susto! O vento, as luzes, os sons, tudo a assustara a tal ponto que perdera o movimento. Sua respiração perdeu a harmonia e seus olhos doíam demais. Cadê a minha decisão? Cadê minha certeza? Ela estava distante de tudo; não tinha mais apegos afetivos ou certezas; e não sabia o que fazer sem a consciência anterior. Quando a porta do telhado se abriu, o mundo a chocalhou e ela se perdeu. Ventava muito lá em cima e a loucura dos seus dias voltou à sua mente com força. Humanos são assim incertos, voláteis e fracos. Somos fracos diante da Natureza e desacreditamos na força do Universo. Nós reagimos, somos impulsivos e quase sempre convivemos com os arrependimentos. Ela ultrapassara esse momento: não tinha mais o que perder; era uma mulher do mundo, totalmente evaporada e dolorida. Sua maior responsabilidade era sua decisão e neste momento vacilava. Será possível? Seria tão medrosa? Depois de tanto trabalho, seria tão covarde? Ao longe, ouve o Bolero de Ravel. Alguém lhe dava 17 minutos para se reencontrar e reagir atravessando cada etapa da sua vida. Seu corpo tremia demais, suas mãos não sabiam o que fazer, sua alma pairava acima dela. Um grito, uma lembrança: respire! Nas aulas de primeiros socorros, aprendera: quando angustiada ou ansiosa, respire; respire tão profundamente que se deixe perder nessa ação. O corpo agradecerá. Essa é a primeira opção à proatividade. As circunstâncias são passageiras. Elas acontecem para nos fazer parar e pensar em nossas posturas. É preciso rever sonhos e fantasias. É preciso dar autoestima até mesmo à imaginação. Alicia, respire! Na vida sempre há meios desde que não finquemos pés e mãos nos mesmos caminhos. Respire! Ao abrir os olhos vê alguém lhe acenando sorridente: era sua mãe. Mudança de planos: estava atrasada para sua defesa de mestrado. Claudia Nunes

162 A Suspeita... Embora as horas tenham passado, a suspeita era mesma: a amizade acabara. Anos antes a vida era de encontros e papos alegres e livres: e a amizade se fortaleceu. E hoje, um vazio de quarto e sala. Sabrina olhava o quarto e suspeitava. Por que não tinha certeza? Ela não perguntara. Seu sentimento já tinha acertado tudo: a amizade acabara. Na janela vizinha, uma musica atravessa portas e fechaduras. Ela tinha que pensar direito: o que houve? A suspeita doía muito. Amizade suspeita não é amizade, é intenção. A suspeita não tinha confirmações; acelerava seu coração, mas encontrava terreno fértil para acreditar: o fim era um fato. Ela sentia uma contrariedade: só tinha seu olhar e sua opinião. A suspeita não tinha comprovação: falaram, disseram, contaram, esses eram os verbos mais usados; e não valiam nada. A suspeita é indeterminada ainda que cause pressentimentos negativos: insegurança e introspecção. A liberdade ganha limites claros e os amigos se medem mais de perto e se distanciam velozmente: Sabrina estava ressentida. O som da música lhe arrebatava para outros sentires passados: estes eram bonitos porque emocionalmente irreais. Mas a memória do agora era mandante de um crime quase perfeito: a dúvida. E ela não sabia o que fazer. Algo aconteceu: hábitos foram quebrados e promessas descumpridas. Não era um tempo de longa amizade: datas são desinteressantes nesta hora, porém fora um tempo de forte confiança. Provação sem provas, e para que provas entre amigos? Deitada, o som a deixava em suas memórias e a escalada à compreensão era dolorida e confusa. Perdera uma amizade bonita! Ela chora; pensa em respeito e chora; lembra de momentos e chora. A suspeita criou choros escondidos e desconfiados do passado agora sem vida. Daquela janela, o vento e o som eram desfeitos e invisíveis: ela esperava apenas a sua hora de força contra o desanimo e a infelicidade. Como se perde uma amizade hoje em dia? Pelas suspeitas, pelas dúvidas, pelas incertas, pelas estranhezas, pelos desgovernos, pelos nadas, pelas inverdades. Ela se sentia impossível. Ao clarear o dia, Sabrina toma um banho e vai para terapia: tinha que superar a morte da mãe. Claudia Nunes

163 Quando o destino nos atinge, a alma se torna especial. Nós revivemos valores e amores com muitas pegadas nas areias do tempo. Não adianta ignorar ou resistir, o sonho aceita outras vidas, silêncios, pensamentos, delicadezas e impaciências do jeito que for. Num sonho de amor, os riscos são as sensações das pazes: elas paralisam / escondem. Mas amar é lutar também pelas pazes. Pazes de paz, de olhar, dos sorrisos, das palavras bem ajustadas aos ouvidos. Nós temos que ficar atentos ao tempo: encontrar é idílico; permanecer é precipício constante; afinal mudar é o ideal. Quando se olharam, o casal se desentendeu e se perdeu: acreditaram numa existência dividida e unida, e se amedrontaram. Com sorrisos cinza, perceberam que o sol brilhava em outras cores e desejaram nascer de novo. Todavia como é bom amar e recompensar o futuro com tantos sonhos e planos devagar, devagarzinho. Com os dias, as memórias tinham sangue, suor, lágrimas e brincadeiras. Um media o outro. Outro apostava no um. Um evoluía com o outro. Outro amava o um. Sem se dar conta, o casal se emocionava com o simples e sua história corria amorosa entre café com bobagens, fotografias de família, comida leve, mares, noites, bocas e mãos. Eles sabiam do risco: falar demais minava as energias e as belezas dos sentimentos. O toque e o olhar eram seus melhores momentos. Não eram perfeitos, apenas se ajuntavam, se ajustavam e se amavam. O amor tem dessas imperfeições, manias e diferenças; porém sua dimensão era divina e maravilhosa. O prazer prevalecia, permanecia e os deliciava com temperos diversos. Sem querer, ao cair da cama, Seixas percebe: abraçava seu ‘canudo’ de formatura. Sonho realizado! Claudia Nunes

164 Anoitecer de um amor Pensando em instinto. Será prepotência? Será orgulho? Eu não sei. Só sei que em tudo há consequências e, às vezes, desastrosas. Mais do que status, o amor pode ser perigoso e tudo começa pelo instinto. Há sentimentos que destronam a beleza dos sentimentos sem dó ou piedade: ciúmes e possessividade. A intimidade às vezes se compõe dessas nuances ilusórias de domínio e controle do outro, e o ser humano não se dá conta de que seu corpo não guarda segredos da essência. Ao contrário, apresenta-se como vítima das circunstâncias e se defende nos becos dos quartos. Seres humanos assim nunca se apresentam no cara-a-cara. Campo aberto para arrogância e a presunção, o ser humano, inseguro de si, levanta armas cruéis: disse-me-disse; esquisitices, olhares e sorrisos fora de hora; desconsiderações etc. Estou estupefata. Há pessoas que se percebem dominadores do outro e constroem uma realidade que ratifica essa sensação. Perdem-se em éticas e morais fragilizadas pelo tempo de contato, ao invés de aprender melhor a mágica de amar de peito aberto. O ser humano está em decadência de sentidos e de reflexão. A questão da convivência investe-se de poder e inaugura posturas mais arrogantes e menos prudentes / humildes. Alias humildade é moeda escassa no mercado das relações amorosas / amistosas. Difícil o silencio, a observação, a proximidade e a flexibilidade de ação e emoção. Amar sugere poder e poder é a fraqueza dos poderosos. Por outro lado, amar sugere receios / medos e estes são a mágica dos compromissos e sonhos. Não há muito o que fazer. Os espaços conquistados não podem ser perdidos, dizem, e assim formam-se guetos / modelos / círculos fechados. Pena. O mundo é coletivo, poroso, hipertextual, e o compromisso com o futuro é solidário e aberto. Amor e amizade não ficam de fora. Eles evoluem, se transformam e permanecem com um, com alguns e com todos. Nós devemos nos concentrar em felicidades e não em dramas particulares ou que apontem culpas inúteis e inócuas. Sinto calafrios a cada vez que sinto o anoitecer de uma relação porque, em minha consciência, amar é fundamental e cabe em todo mundo. Sinto calafrios, mas me esforço por espalhar ações e juntar emoções positivas, em todos os lugares. Ser especial é natural e eu não perco os especiais para mim. Ufa! Claudia Nunes


Experiências de sensibilidade 144, 145, 147, 148, 149, 150, 151, 152, 153, 154, 155, 156

144 Feminino Livre


Pés descalços, ela se sentia livre.
No chão da sala, da rua e da vida, ela era livre.
Só que não era aceita: era somente livre
Sem pensar foi ser luz nos palcos da vida
Ganhou asas e se sentiu livre.

Enquanto vivia o sonho, lutou pela sobrevivência,
Perdeu maturidade, segredos e saliências.
Ela correu pelo mundo, amou e desprezou sem licenças.
Sujou a roupa de tudo e sem força, foi livre e muito livre.
Nunca fora comum, amava o incomum e sofreu demais.
Ela queria as sensações, as emoções e todos os perdões.
Mas seus sonhos não eram segredo: era artista e livre.

Quando livre, teve medo;
Com medo, agiu com força;
Com força, armou seu palco
E, no palco, foi corpo sem receio.
Que bom viver livre!

Ela se ofereceu, conquistou e cresceu.
Sua alma não fingiu: vital e fina
Um luxo de camafeu que
De mergulho em mergulho, rompeu cascas e sina
E foi ser feliz na noite dos gozos de Orfeu.

Hoje, ela é fênix e heroína do seu tempo.
Não sabe viver com medo ou com certezas.
Ela vibra com os pés no firmamento
Misturada com seus pensamentos e levezas,
Mas não tem endereço,
Começo
Ou avesso.

Vazia, oculta, simples, ela alcançou todas as clemências
E foi ser feliz sem ausências.
Livre sem luxos ou lixos
Gratidão e presença são sua onda e inteligência.               Claudia Nunes

145 VER / OLHAR

Embora VER seja importante
OLHAR é gigante
Entre ver e olhar há diferenças
E assim eliminam-se desavenças.
Sejamos menos moribundos
Com muitas licenças
Afinal se somos imperfeitos
Com atenção
Sejamos direitos
Sem ilusão.                         Claudia Nunes

147 UMA EMOÇÃO

O corpo é movimento
O cérebro, adaptação
O gesto, um momento.
Quando pensamos em amor
Amor é emoção
Solidão
Construção
Mas se o amor termina
O gesto é lamento
O cérebro, desconstrução
E o corpo, um tormento
            Sejamos felizes de qualquer jeito
            O dia seguinte é sempre perfeito
            E sem ilusão.                          Claudia Nunes


148 ILUSÕES

Sem tempo, criamos ilusões
Sem vida, vivemos ilusões
Sem amigos, aceitamos ilusões
Ilusões de ser
Ilusões de viver
Ilusões de sentir
Quando a porta se abre
            Estamos inertes
                           imberbes
                           impotentes
                           carentes
            Ilusões são ilusões
Imaginemos...                         Claudia Nunes


149 OS PÉS

Quando olhamos os pés
Esquecemos os ventos.
Pés se firmam
Plantam
Equilibram
Quando os pés são
Somos os sonhos
Que serão.               Claudia Nunes


150 DESEJO

Eu não sei sentir
Eu sei perceber.
Na vida, sentir e perceber
São oportunidades de ir,
São momentos de viver.
Quero buscar um andar
E ignorar o caminhar.
Quero sentir e perceber.
Quero sentir o mundo,
Perceber o imundo
E ignorar o não-saber.
Eu não sei sentir
Eu sei perceber
Então vou partir
E crescer.          Claudia Nunes


151 PENSANDO

Ao longe, quando o entardecer surge
A brisa constrói outras vivências.
Vou caminhando com meus pensamentos
e guardando novas emoções.
Embora os passos sejam ao longe,
sinto que o próximo é o mais elegante.
Sou alvo de tudo,
mas me ajeito e me aceito.
Agora sou do mundo
e desapareço.              Claudia Nunes


152 OS SONS

Mãos essenciais
Toques elementais
Gestos surreais
Embora a lua
Surja fina e clara
Quero os sons do
Imortais.                      Claudia Nunes


153 FAMÍLIA

Naquela cabana antiga
A vida começava todos os dias
A família se mantinha
Na luta, na lida, nas vidas,
Sem mofo.

O pai tinha força
A mãe tinha atitude
E os filhos tinham emoção

Um dia, a chuva chegou
E os corpos foram encontrados
No meio da confusão

Os filhos eram lembranças
A mãe era ilusão
O pai era sensação

Quando a Natureza avança
A vida termina
E naquela cabana antiga
A família se mantinha
De novo e de novo...            Claudia Nunes


154 INVASÃO

Ele entrou pela fresta do coração
Arrumou suas memórias e sentimentos
Descartou visões e olhares vãos
Se instalou, viveu e morreu sem lamentos
Agora ela está só
Sem pressão
Sem colares
Ela e seu camafeu
Num mundo só seu.         Claudia Nunes


155 REVISÃO

Quando pensamos na vida
Pensamos em gentes,
Gente que vem e que vai
E se tornam inerentes.

Somos passagem e memória
Dos afetos bons e maus em vertente
E dia após dia
Reinventamos o corpo e a mente
Sempre diferente e independente
Por causa dos amigos
Cientes.

Só que levamos no corpo e na mente
Todas essas afetivas verdades
Sempre muito de repente.
Então não aceitemos a simplicidade,
Sejamos disponibilidade
E ainda, responsabilidade.

Amizades são abertas e espertas
Às vezes incertas,
Às vezes corretas,
Mas sempre sinceras
E alertas

Sem querer doamos nosso tempo
Para a atenção, a angustia, os medos, as vitórias
Sem pensar em passatempo
Ou glórias.
E aprendemos
E vivemos
E sentimos
De coração
De emoção
De confiança
E de aliança.

Aos amigos da vida,
Presentes ou distantes,
Estou feliz por existirem
Estou feliz por me seguirem
Estou feliz pelas pegadas em minha alma
Estou feliz pelos dias
Estou com saudades dos dias.       Claudia Nunes


156 SILÊNCIOS

Quando vivemos
Aprendemos e convivemos,
Entendemos que os outros são ventos
E ventos têm barulhos intensos
Que recolhem nossos pensamentos
E diminuem os nossos lamentos
Com belo arrebatamento
E tudo em silêncio...

Quando convivemos
Façamos estes silêncios
E vivamos muitos momentos
Com verdadeiros sentimentos,
Sem os ciumentos
Ou os fingimentos.

Quando vivemos
Amar é nosso maior alimento
Um poderoso condimento
Que grita simples envolvimentos
E complexos comportamentos
Sem perder ligamentos
Ou os argumentos.

Quando convivemos
Lógico que haverá estranhamentos
Palavras de sofrimento
E momentos de distanciamentos.
Com negativos arrebatamentos,

Então,
Pense em silencio
Aceite seu silencio
Aja no silêncio
Sinta o acontecimento

E no puro firmamento,
Sem vaidade: amizade.          Claudia Nunes

Experiências de sensibilidade 137, 138, 139, 140, 141, 142

137 Dor e dores

Sinto a dor plena
Sinto a dor plana
Sinto a dor pano de fundo
Sinto a dor louca de vida
Das dores sentidas na noite
Sinto a dor dos luxos e luxúrias
Sinto a dor das perdas sem ganhos
Quando sinto dor escolho
Senta aqui e sinta a dor minha
É tarde para sondar a dor
É noite para sanar a dor
Sente dor os vivos
Sente dor os inquietos
Sente dor os ilustres da dor alheia
Das dores da vida meus guias
Das dores do corpo minhas alegrias
Das dores da alma meus afetos
Quando sinto dor uma alma morre
Quando sinto dor um beijo se perde
Porque morrer é dor sem dó
Porque morrer é dor sem dom
Porque morrer é dor sem tom
Sorriam enquanto há dor
Lutem pela dor
Nunca esqueçam a dor
Aprender sempre começa na dor
Dói! Doem!          Claudia Nunes



138 Próprio amor próprio

Ame ao próximo
Ame em primeiro lugar
Ame sem esperar
Ame com delicadezas
Sem tempo de viver
Ame com amor e liberdade

Se em tantos abandonos
Pensamos em felicidades
Ame destinos
Ame dores
Ame anseios
Ame loucuras
Sem tempo de pensar
Ame com sentidos inteiros

Se em tantos projetos
Vivemos momentos
Ame as verdades
Ame os infernos
Ame as mentiras
Ame os silêncios
Sem tempo de sorrir
Ame o fim de tudo

Vamos prestar atenção
Vamos sentir aversão
Vamos compor alegrias
E com tantas vantagens
Temos uma viagem
Temos muitos riscos
Temos várias marcas
Temos mil vontades

Aceitemos muitas emoções
Então ame!
Seja franco e ame!
E comece por você: ame!          Claudia Nunes



139 O som dos amigos

Amigo é um ser no olho do furacão
É um ser diante da retina,
É um ser vidrado nos olhos,
É um ser de olhos de outros.

Infinitamente
Amigo é um ser que faz parte,
Faz ponta, faz ponte,
faz peso, faz pingo, sem suspenses.
É um ser das rotinas e das surpresas
Das luzes e dos abraços
Dos desencontros apertados
Das horas sem promessas
Boas ou más, os amigos.

E assim se fazem evoluções
Revoluções
Loucuras
Senões
Universais.

Amigo é aprendente
De saúde e sabedoria
De fogo e água fria
De cor e manchas coloridas
De brilhos e cinzas metálicos,
Sem quebrar o ritmo da música.

Amigo é casa
É conjunto
É sem pressa
É sorriso torto
Então, na janela do carro,
Na janela do mundo,
No vão das portas,
Amigo transborda
Age, toca, ama, envolve e luta.

Hoje, amigo é um luxo,
Não finge ou amarga frescuras.
É lance do instante e tudo da vida.
Façamos o nosso caminho de flores
De amigos simples e ilustres
Sem meta, mito ou morte.

Pedras? Façamos castelos de paz
E de resto,
Assim se fazem amigos.          Claudia Nunes



140 Entre guerra e paz...

Guerra!
Quando a vida disse não,
Eu enviei amores e promessas.
Quando a vida disse sim,
Eu amei com dores e pressas.
Tudo foi evolução, conclusão e emoção,
Tão fortes, que sequestrei a sorte.
Fui ser doce em universos diferentes,
Com loucuras insistentes
E vontades indigentes.
Mas era preciso ser reticente e sobrevivente
Então conquistei independência,
Estraguei resistentes
E orei a divina essência.
Agora, quando penso em luz e sombra,
Penso em paz e sossego
Penso em gente e apego
Penso em amor e sempre.
Eu sou penumbra, lamento e instante,
Só que sem tensão, agito e arrogância.
A vida me conquistou e me revirou.
Agora, na pureza do gesto,
Sou ambulante e modesta
Um ser de dores honestas.
Paz!            Claudia Nunes



141 Selo de Autenticidade

Ontem eu desisti
Fui imoral e desisti
Insisti mas desisti
Às vezes a vida escolhe
E uma onda mórbida nos encolhe

Eu me defendi e desisti
Eu sei fazer isso bem.
Em grande avalanche branca desapareci,
Braços ou pernas em rota para o além.

Sem confiança,
As pessoas me significaram errado.
Eu aceitei e desisti como criança.
Diante da lua, eu estava desgarrado.

Afeto, imaginação e desistência,
Será que há pontos de fuga?
Quero outras salvaguardas e lutas
Quero outras andanças e inocências

Em que momento tudo mudou?
Na hora da minha insanidade,
O tempo passou demais,
Outras pessoas me afetaram demais,
Estive numa teia de afinidades demais,
E tudo pôde sem autenticidade.

Que palavra!
Descansei e não desisti
Sou o privilégio do mundo
E no mundo vou encantar minhas escolhas.
Não aceito ‘viradas de mesa’
E nem o império das simulações
Pois viver é fácil
Basta seguir o sol e os sentidos;
Sem surpresas
Renasci.

Estou no jogo outra vez.           Claudia Nunes



 142 O Fim

Sem querer uma palavra maldita,
Sem entender uma fala mal dita,
Sem atenção, o inconfesso e o perdido.
Éramos desejos implícitos,
Agora somos mal ditos e incontidos.
Tudo é esquecimento.
Tudo é lamento...

Na sala de estar, o ar pesou e fomos infelizes.
Na cozinha, o cheiro não nos deixava respirar.
Amor e ódio tinham muitas cicatrizes,
Afinal, não éramos mais urgentes e imperativos.
Somos loucura.
Somos censura...

A expressão do sentir se perdeu,
Doeu, rompeu, entristeceu...
Você não me ama mais!
Você me esqueceu...
Você mudou demais!
Você me adormeceu...
E nada restou...

Os sonhos estavam sem norte
E nós não éramos mais da sorte.
Naquela noite sem lua,
A ignorância do amor se fez desabafo,
Sarrafo, inconfessado, frustrado.
Tapas no corpo, manchas na pele, vazios no peito.
E nada vingou...

O amor se desligou e fugiu na noite mais escura
Chorando, dolorido, ensanguentado de amar.
Nós vimos o brilho da infelicidade
E saímos pelas cidades e pelo tempo
Em busca de novidades...
Em busca de outros nós...
E tudo mudou...

Muitas trilhas de rosas e espinhos.
Outros vingaram nossos sentidos e nossas curvas.
Não havia infâmias apenas outros vinhos e linhos,
Além de uma colcha de verdades esquecidas e turvas:
Amar exige sinceridades.
Amar importa imensidades.
Então um conselho:
Desista! Exista!                Claudia Nunes

Nada nunca é igual

  Nada nunca é igual   Enquanto os dias passam, eu reflito: nada nunca é igual. Não existe repetição. Não precisa haver morte ou decepçã...