segunda-feira, 24 de agosto de 2009

COMO APRENDER?


Na área da Educação, muitos autores falam sobre as formas de aprender, estratégias de aprendizagem e sobre as relações professor-aluno. Rubens Alves, Tania Zagury, Içami Tiba, Celso Antunes etc. produzem livros e mais livros de ajuda aos professores de educação infantil, especial e de ensino médio. Mas e a realidade? Há uma crítica generalizada sobre a qualidade de ensino, formação de professores e atividades pedagógicas no Brasil. Mas e a realidade? Numa escola do estado, ajustada no espaço físico de uma escola do município, boas partes dessas teorias encontram muitos entraves. Localizada no subúrbio do RJ, seus alunos não desenvolvem a atenção necessária para gerar aprendizagem. É culpa do professor? É só isso que se sabe dizer?

O encontro com o conhecimento é fragmentado. Os limites são desconsiderados. E os professores retroagem por defesa: escrevem sem parar no quadro negro para compor a hora de aula; aplicam questionários sobre capítulos dos livros para obrigar os alunos a ler; aplicam testes surpresas por causa das indisciplinas; além do que se apresentam duros e ríspidos para o aluno. Será isso algo tão indesculpável assim? É retrógado, mas indesculpável? Não sei... afinal, são muitos anos de desvalorização total e ‘anos de desvalorização’ não fazem crescer nenhuma auto-estima ou estimula um aprendizado continuado. Como dar o que não se tem?

Quando pensamos na palavra ‘aprender’, pensamos em ‘sem prisões’, ‘sem fechamentos’, pensamos em ações que ampliem o cabedal de informações dos alunos de forma a que possam solucionar problemas cotidianos e se integrar em diferentes relações e no mercado de trabalho. Mas no contexto sociocultural e tecnológico atual, a escola tem assimilado de forma paulatina e gradativa às novidades pedagógicas e tecnológicas. Por quê? Porque o espaço escolar é um espaço de múltiplos desejos que precisam encontrar a oportunidade de se objetivarem. Esta oportunidade só acontece com a organização (e filtragem) das múltiplas seduções do mundo. E isso leva tempo. Isso requer responsabilidade de toda uma equipe. Isso requer conhecimento sobre as demandas do novo tempo. Isso não é a ‘casa da mãe joana’!

Para aprender sai-se de um monólogo tradicional para o fomento constante de diálogos complexos e interativos, dentro de uma democracia de atitudes, e não de uma anarquia de perspectivas criadas por teóricos criativos. É importante ler e conhecer outras maneiras de ensinar, de entender a dinâmica cognitiva, de construir relações diversas. Mas professores são sujeitos com memória cultural própria; experienciaram as relações de forma única; tem identidades (links com a realidade) diferentes; logo, visões de/sobre o mundo e sobre formas de ensinar foram construídas de jeitos muito particulares.

Aí dizem a escola é chata. Chata por quê? Na escola, a aprendizagem informal ganha tons formais porque há uma intenção de formação e conhecimento de valores. Torná-la um constante parque de diversões não é possível.

Profa. Claudia Nunes

O AMOR ACABA...


O amor acaba. Numa esquina, por exemplo, num domingo de lua nova, depois de teatro e silêncio; acaba em cafés engordurados, diferentes dos parques de ouro onde começou a pulsar; de repente, ao meio do cigarro que ele atira de raiva contra um automóvel ou que ela esmaga no cinzeiro repleto, polvilhando de cinzas o escarlate das unhas; na acidez da aurora tropical, depois duma noite votada à alegria póstuma, que não veio; e acaba o amor no desenlace das mãos no cinema, como tentáculos saciados, e elas se movimentam no escuro como dois polvos de solidão; como se as mãos soubessem antes que o amor tinha acabado; na insônia dos braços luminosos do relógio; e acaba o amor nas sorveterias diante do colorido iceberg, entre frisos de alumínio e espelhos monótonos; e no olhar do cavaleiro errante que passou pela pensão; às vezes acaba o amor nos braços torturados de Jesus, filho crucificado de todas as mulheres; mecanicamente, no elevador, como se lhe faltasse energia; no andar diferente da irmã dentro de casa o amor pode acabar; na epifania da pretensão ridícula dos bigodes; nas ligas, nas cintas, nos brincos e nas silabadas femininas; quando a alma se habitua às províncias empoeiradas da Ásia, onde o amor pode ser outra coisa, o amor pode acabar; na compulsão da simplicidade simplesmente; no sábado, depois de três goles mornos de gim à beira da piscina; no filho tantas vezes semeado, às vezes vingado por alguns dias, mas que não floresceu, abrindo parágrafos de ódio inexplicável entre o pólen e o gineceu de duas flores; em apartamentos refrigerados, atapetados, aturdidos de delicadezas, onde há mais encanto que desejo; e o amor acaba na poeira que vertem os crepúsculos, caindo imperceptível no beijo de ir e vir; em salas esmaltadas com sangue, suor e desespero; nos roteiros do tédio para o tédio, na barca, no trem, no ônibus, ida e volta de nada para nada; em cavernas de sala e quarto conjugados o amor se eriça e acaba; no inferno o amor não começa; na usura o amor se dissolve; em Brasília o amor pode virar pó; no Rio, frivolidade; em Belo Horizonte, remorso; em São Paulo, dinheiro; uma carta que chegou depois, o amor acaba; uma carta que chegou antes, e o amor acaba; na descontrolada fantasia da libido; às vezes acaba na mesma música que começou, com o mesmo drinque, diante dos mesmos cisnes; e muitas vezes acaba em ouro e diamante, dispersado entre astros; e acaba nas encruzilhadas de Paris, Londres, Nova Iorque; no coração que se dilata e quebra, e o médico sentencia imprestável para o amor; e acaba no longo périplo, tocando em todos os portos, até se desfazer em mares gelados; e acaba depois que se viu a bruma que veste o mundo; na janela que se abre, na janela que se fecha; às vezes não acaba e é simplesmente esquecido como um espelho de bolsa, que continua reverberando sem razão até que alguém, humilde, o carregue consigo; às vezes o amor acaba como se fora melhor nunca ter existido; mas pode acabar com doçura e esperança; uma palavra, muda ou articulada, e acaba o amor; na verdade; o álcool; de manhã, de tarde, de noite; na floração excessiva da primavera; no abuso do verão; na dissonância do outono; no conforto do inverno; em todos os lugares o amor acaba; a qualquer hora o amor acaba; por qualquer motivo o amor acaba; para recomeçar em todos os lugares e a qualquer minuto o amor acaba.

LYA LUFT

terça-feira, 11 de agosto de 2009

MARÍLIA, A Humana Louca


A poucos dias eu vi o show “Elas cantam Roberto”. Surpreendi-me com algumas interpretações, mas nada fora do normal. Mulheres, cantoras, fãs estavam cantando o ídolo, os afetos, a infância, a memória com singeleza, alegria, graça e beleza. Como tantos outros shows produzidos para TV, grandes revisitações de nossas estrelas musicais estavam ali representados. Tudo muito belo e simples. Repentinamente, adentra ao palco, Marília Pêra. Marília Pêra? Sim, Marília Pêra. Mas o que Marília Pêra faria ali? Minha atenção foi completamente seqüestrada. Marília Pêra é sinal de diferença e de grandiosidade. Atriz, intérprete e bailarina, num fundo negro, num figurino negro, a personagem atravessa o palco e suspende minha respiração. A orquestra inicia os primeiros acordes e adensa as sensações que ainda nem aconteceram. A música é ‘120... 150... 200km por hora’. Marília está incorporada. Declamando, interpretando, cantando, a música ganha cor, realidade e imagem. É isso! Marília dá imagem à letra da música com uma carga feroz de emoção. A personagem que segue dirigindo seu carro pela loucura da vida está ali em sua dor, angústia, desequilíbrio, incerteza. Marília, personagem, provoca desassombramento dos sentimentos, das negações, das perdas. Se o mundo lhe esqueceu, para que a organização? Ou cumprimento de regras? Ou respeito às pessoas? Nos gestos, o que quer é ‘seguir caminhos que a levem a lugar nenhum’! Marília, desta vez, não canta! Marília vive cada velocidade ‘sem poder parar’! Sua voz embargada e cheia de nuances está colocada em função da interpretação e da loucura que é sentir-se perdida existencialmente ‘voando pela vida sem querer chegar’. Cada parte da música tem, em sua presença de palco, ora o raciocínio da personagem, ora seu processo de enlouquecimento, em velocidades diferentes. É a loucura humana de continuar vivendo apesar de jogado ora nas profundezas do inferno, ora nas agonias da perda, ora ainda num vácuo perfeito de sensações sem sentido. Marília nos faz entrar numa espiral rascante ‘sem saber pra onde e nem quando parar’. Agora estou no Youtube e revendo a cena. Lindo! Excessos pertinentes! Indignação no ponto certo! Até o fim Marília nos leva a uma arritmia de lembranças. Da mais feliz à mais deprimente, não há volta. No fim, de costas, ignorando ‘as marcas no caminho para não querer voltar’ e a 200km por hora, Marília vai embora, aos berros! Sem olhar para trás e gritando as verdades da personagem, Marília evita a possibilidade de vida e... acelera, esquece, apaga e desaparece. O corpo se perdeu nas brumas das emoções (na junção das cortinas), mas permanecemos atravessados pela voz. Meu coração não bate, pulsa forte. Na garganta, o sentimento daquela loucura vertiginosa e descompassada. Marília se esvai deixando um grito na garganta: aaaaaaaaaaaaaaaaa... Foi-se...




Profa. Claudia Nunes

Nada nunca é igual

  Nada nunca é igual   Enquanto os dias passam, eu reflito: nada nunca é igual. Não existe repetição. Não precisa haver morte ou decepçã...